quarta-feira

TRANSTORNOS PSICO-PSICOLÓGICOS

Cumpre urgentemente organizar os chamados transtornos psicológicos em cinco grandes categorias, ordenadas segundo sua etiopatogenia, assim:

1) Transtornos anatomo-psicológicos;
2) Transtornos ergo-psicológicos;
3) Transtornos psico-psicológicos;
4) Transtornos psicológicos de etiopatogenia mista;
5) Transtornos psicológicos de etiopatogenia desconhecida;

.

sábado

THE LOGANALYTIC PROJECT

I will presently describe the basic knowledge concerning psycho-hygiene, or psycho-sanitation if you prefer, that the Loganalytic Project intends to share with the general public:

1.      Every instrument needs maintenance, otherwise its efficacy will gradually be jeopardized, to the point of becoming completely useless;
2.      Our mind is our most important tool, and the correct way to keep it functional  is to alternate periods of task completion with periods of maintenance;
3.      To produce a fair balance between these two periods, we have to find a fair balance between the use of (a) executive language (EL) and (b) repairing language (RL);
4.      Homo Sapiens have, over the last 200,000 years, become masters in developing EL, as non-social sciences demonstrate, but, until now, has not been able to develop an apt view of the nature and best use of RL;
5.      My clinical experience has led me to conclude that 75% of patients looking for psychological help are suffering from the consequences of insufficient and/or inappropriate use of RL, the repairing language, so I decided to teach not only those directly linked to me, patients or otherwise, but also the general public, the nature and best way to make use of it.  Setting myself up to do this, I was astonished by the
5.1.   Simple nature of RL;
5.2.   How easily lay people could make good use of RL if duly instructed, thereby getting rid of a host of psychological dysfunctions – theirs and of the people surrounding them (sons and daughters, spouse, friends, neighbors, colleagues);
6.      The essential knowledge concerning RL is that, amidst the infinite number of sentence constructions at the disposal of each language, there is only one kind of construction capable to perform repairing functions, and it has three basic characteristics:
6.1.   Its subject is in the first person singular => “I”;
6.2.   The verb describes the emotion the subject is feeling now, did feel in the past or is expecting to feel in the future;
6.3.   There is some kind of adverbial complement that links such a feeling to a specific situation;
7.      All sentences that do not present these three features do not perform repairing functions; so, for instance:
7.1.1.      “You’re always disrespecting me!” has no repairing function;
7.1.2.     “Yesterday, I felt very disrespected when you exposed part of my private life to my boss” has repairing function;

8.      Learning to make regular use of – when it will not disturb the performance of some adequate executive action, of course – of sentences presenting these three features makes mental dysfunctions gradually disappear in 75% of the patients looking for psychological help (it certainly doesn’t function with people suffering from mental retardation, dementia, psychosis or psychopathy, who account for the remaining 25%);

sexta-feira

HIPNOSE, CONSCIENTE E INCONSCIENTE


Nos idos dos anos de 1980, um experimento hipnótico foi levado a efeito em minha clínica por Karl Weissmann, austríaco residente no Brasil, um dos que colaboraram para a introdução da Psicanálise em nosso país e do qual fui paciente durante cerca de dois anos. Tenho ainda comigo uma cópia de uma carta manuscrita que Freud lhe enviou e que está reproduzida na edição completa da biografia do criador da Psicanálise escrita por Ernst Jones. Weissman era também excelente hipnólogo, com livro publicado sobre a matéria, e foi ele quem conduziu o experimento hipnótico que logo passo a descrever.
Na sala de minha clínica onde o experimento ocorreu estávamos ele e mais 6 psicoterapeutas, eu entre eles. Weissman abriu o encontro, declarando: "Hoje, vou mostrar a vocês, de maneira empiricamente palpável, a diferença entre consciente e inconsciente". Solicitou que ficássemos em pé, numa fila horizontal em relação ao ponto em que ele se encontrava e, isso feito, chamou o sexto ocupante da fila - o último à direita; não era eu - a quem chamarei de Beltrano e hipnotizou-o, passando-lhe, durante seu transe, as duas seguintes ordens:
(1) A primeira correspondia ao que, em jargão técnico, se denomina "indução de alucinação negativa pós-hipnótica": ele, ao sair do transe hipnótico, NÃO IRIA MAIS VER fulano, aquele, dentre nossos colegas, que, contando-se da esquerda para a direita, estava na quinta posição da fila (e que, mais uma vez, não era eu);
(2) A segunda foi a de que, ao sair do transe, iria esquecer (a) DE QUE HAVIA SIDO HIPNOTIZADO e (b) DE QUE, DURANTE A HIPNOSE, RECEBERA A ORDEM DE NÃO MAIS VER FULANO.
Completadas essas duas etapas e já com Beltrano fora do transe hipnótico (dando claros indícios de que não se dava conta do que ele havia ocorrido), Weissmann postou-se exatamente atrás de Fulano (que meu psicanalista espertamente escolhera por ser o mais baixo do grupo e, certamente, mais baixo do que ele), o qual, segundo a indução pós-hipnótica, BELTRANO JÁ NÃO ESTARIA MAIS SENDO CAPAZ DE VER, pedindo a esse último que ele se deslocasse em sua direção. Ora, com Weissmann exatamente atrás de Fulano, Beltrano, obrigado pós-hipnoticamente a não o ver, partiu na direção do psicanalista, em óbvia rota de colisão com nosso companheiro. Silencioso suspense em toda a sala, enquanto Beltrano continua avançando, em plena rota de colisão com Fulano, avançando, avançando, avançando e... E, no último momento, desvia-se de Fulano, chegando a Weissmann sem maiores tropeços. Caramba, eu não ia mencionar isso: com efeito, quando ele se aproximou excessivamente de Fulano, DEU EXATAMENTE UM PEQUENO TROPEÇO, que o fez desviar-se para direita e, após, corrigindo sua rota novamente para a esquerda, chegando incólume, mais surpreso do que eu fiquei agora, ao hipnotizador e dizendo: "Caramba! Eu tropecei, né?" Ao que Weissmann retrucou simplesmente "É" e voltando para nós, em seguida, para discursar:
"Está aí, senhores! Agora já estão preparados para entender a diferença entre o CONSCIENTE e o INCONSCIENTE da Psicanálise. Fulano estava CIENTE da presença de Fulano, mas, devido à interdição da ordem pós-hipnótica, não estava CO(NS)CIENTE dela; segundo o armamental de conceitos psicanalítico, ele estava, quando tropeçou, tendo seu comportamento dirigido por seu IN-CO(NS)-CIENTE. Só tinha CIÊNCIA, não tinha CO(NS)CIÊNCIA. Não só tinha APENAS UMA, das DUAS CIÊNCIAS que pode ter a mente humana, como fica claro que a hipnose e todas as outras ações que tentam bloquear o acesso de nossas mentes a um determinado tipo de informação SÓ TEM CAPACIDADE DE INIBIR UMA DELAS, porque a PRIMEIRA CONTINUA EXISTINDO E OPERANTE, capaz de gerar atos sintomáticos, como o tropeço de Beltrano, e uma infinidade de sintomas, que DESAPARECEM QUANDO A DUPLA CIÊNCIA, A (CO)CIÊNCIA, É RESTAURADA.
Esse episódio me ensinou mais sobre CONSCIENTE e INCONSCIENTE do que toda a literatura que compulsei sobre a matéria. 

domingo

BATE PAPO COM FREUD


BATE PAPO COM FREUD[1]

César Ebraico


Eu: — Freud !
Freud: — Humm?
Eu: — Preciso conversar com você. O assunto é grave.
Freud: — O que foi?
Eu: — Acho que você deu um fundamento behaviorista à Psicanálise e isso está dando a maior confusão.
Freud: — Behaviorista? Que é isso?
Eu: — É simples. É uma escola de pensamento que afirma que o único tipo de dado psicológico merecedor de ser considerado científico são os que se podem diretamente observar.
Freud: — Que estupidez! Eu não tenho nada a ver com isso!
Eu: — Tem.
Freud: — Como?
Eu: — Quer ver?
Freud: — Duvido um pouco, mas vamos lá.
Eu: — Tem mais: o que é behaviorista em sua teoria global é a sua teoria da sexualidade.
Freud: — O quê???!!!
Eu: — Isso mesmo que você ouviu. Você não ampliou o conceito de sexualidade?
Freud: — Sem dúvida. E isso é fundamental.
Eu: — Acredito, mas tem confusão aí.
Freud: — Como assim?
Eu: — Como foi a ampliação que você fez desse conceito?
Freud: — Fiz três ampliações básicas: estendi a sexualidade à infância; estendi-a ao simbólico e ampliei o próprio conceito de sexualidade para além de suas vinculações com o fim de reprodução.
Eu: — Você se importaria de falar um pouco sobre cada uma dessas ampliações?
Freud: — De forma alguma. Vamos por partes. No que diz respeito à primeira, a extensão à infância, era evidente o absurdo de se imaginar que a sexualidade havia caído do céu na puberdade, sem que houvesse passado por estágios anteriores, infantis, de desenvolvimento. Você deve, inclusive, se lembrar de eu haver declarado que me sentia meio mal com o fato de que parte de minha fama era devida a eu sustentar a veracidade de um fato fartamente conhecido por qualquer babá.
Eu: — É verdade. E a segunda extensão?
Freud: — Bem, mostrei com ênfase e clareza como a sexualidade invadia os símbolos usados pelo ser humano. Como, p.e., ao falar de uma minhoca entrando na terra, podemos estar querendo nos referir ao coito. Mas, aqui, também chamei atenção para como todo esse conhecimento parece estar à disposição de qualquer um de nós, mesmo não psicanalistas, fato que se revela, p.e., na especial capacidade de as pessoas apaixonadas compreenderem os mais sutis símbolos enviados pelo objeto de suas paixões.
Eu: — E a terceira extensão?
Freud: — Como eu disse, estendi o conceito de sexualidade para além de suas vinculações com o fim de reprodução.
Eu: — Tem behaviorismo aí.
Freud: — !?
Eu: — Posso demonstrar-lhe isso. Mas dependeria, se você estiver de acordo, de que me repetisse os argumentos em que fundamenta essa terceira extensão.
Freud: — Não me custa. Na verdade, é bem simples. Essa extensão se baseia na análise das perversões. Aliás, você deve se lembrar de que, em minhas “Conferências Introdutórias à Psicanálise”, deixei bem claro que essa análise das perversões é o único fundamento para a nossa afirmação de que sexualidade e reprodução não coincidem.
Eu: — Sua análise das perversões é behaviorista, não é psicanalítica. Repita a sua argumentação e mostro-lhe isso.
Freud: — Aceito o desafio. Responda-me, então: homossexualidade, pedofilia, sadomasoquismo, fetichismo são perversões sexuais, não são?
Eu: — Não tenho dúvidas quanto a isso.
Freud: — Pois bem. Homossexualidade, pedofilia, sadomasoquismo, fetichismo têm alguma coisa a ver com os fins de reprodução?
Eu: — Você acha que não?
Freud: — Você tem alguma dúvida? Você acha, por exemplo, que uma relação sexual anal tem alguma coisa que ver com os fins de reprodução?
Eu: — Você andou tendo aulas com Watson?
Freud: — Watson?
Eu: — Fundador do behaviorismo...
Freud: — E o que tem ele a ver com esse seu argumento?
Eu: — Olha aqui, Freud: se Watson me dissesse que uma relação sexual anal nada tem a ver com os fins de reprodução porque não há ovários nos intestinos, estava tudo bem. Você não tem esse direito. Não porque eu lho tire, mas pelas próprias posições teóricas e metateóricas que você mesmo adotou.
Freud: — Que é “metateórica”?
Eu: — Não importa. Peço, apenas, que você siga uns instantes meu raciocínio e você entenderá o que quero dizer.
Freud: — Vejamos.
Eu: — Pois veja. Você não estendeu a sexualidade ao simbólico, como você mesmo afirmou há pouco?
Freud: — Sem dúvida.
Eu: — E não foi você que expôs ao mundo a tão freqüente fantasia infantil de que crianças nascem pelo ânus?
Freud: — Você sabe que sim.
Eu: — Pois bem, o que terá impedido a você, que reconheceu tão claramente as fantasias infantis de nascimento pelo ânus, de ver a possibilidade de que, no coito anal, esteja subjacente a fantasia de emprenhar a mulher pelo mesmo lugar em que se fantasiou que ela é capaz de parir? Falando de forma mais geral: o que lhe terá impedido de entender as perversões — seja a relação anal, sejam quaisquer outras — como o resultado do conflito entre o desejo de reprodução e as demais forças que se opõem a ele? Na verdade, posso-lhe afirmar que, nas análises que realizei, as perversões sempre se revelam como expressões distorcidas — daí o termo “per-vertidas” (vertidas em um lugar marginal) — de um desejo de reprodução. Só um behaviorista pode afirmar que uma relação homossexual não tem nada a ver com o fim de reprodução, porque não é capaz, como deveria ser um psicanalista, de hipotetizar que essa relação pode simplesmente ser o desvio, por razões defensivas, dos desejos sexuais para um lugar onde a reprodução não pode ocorrer. Você sabe muito bem que o fato de um impulso não atingir o fim que almeja não desqualifica esse fim como sendo o almejado. Falou isso claramente, quando afirmou que o fato de determinados sonhos produzirem angústia não desconfirma a hipótese de que, originalmente, sua meta era produzir prazer: mostra, apenas, que algum obstáculo impediu que esse fim fosse atingido. E acrescente-se, dizer que uma árvore frutífera não tem nada a ver com produzir frutos porque, por exemplo, não atingiu a idade de fazê-lo, ou porque a puseram abaixo antes disso é um raciocínio tão primitivo que não faz jus à genialidade de sua restante produção teórica.
Freud: — !?
Eu: — Quero-lhe fazer mais uma pergunta.
Freud: — Ainda estou pensando no que você me disse, mas faça.
Eu: — O que é que você acha de sua própria afirmação de que a mulher não tem medo de castração porque não tem pênis?
Freud: — Alguma coisa de errado também aí?
Eu: — Lamento, mas acho que sim.
Freud: — O quê?
Eu: — Você, certamente, já visitou uma fazenda.
Freud: — Claro.
Eu: — E, possivelmente, já viu castrarem algum animal.
Freud: — Um cavalo.
Eu: — Foi o pênis que tiraram dele, Freud?
(Silêncio)
Eu: — Foi o pênis, Freud?
Freud: — Não, foram os testículos.
Eu: — Responda-me mais uma coisa: você se lembra de Frau Meyer?
Freud: — A dos gatos?
Eu: — Exato. Lembra-se de que havia uma gata da qual ela nunca se separava?
Freud: — Claro. Uma angorá branca.
Eu: — Lembra-se de que ela mandou castrar essa gata?
Freud: — É verdade.
Eu: — Então, diga-me uma coisa: foi o pênis que tiraram da gata?
(Silêncio)
Eu: — Foi o pênis, Freud?
Freud: — Não.
Eu: — Foi o quê?
Freud (com evidente má vontade): — Os ovários.
Eu: — Então, Freud, como é que a mulher não pode ter medo de castração?
Freud: — Confesso que estou um pouco confuso...
Eu: — Talvez eu possa ajudá-lo.
Freud: — Por favor...
Eu: — Vou usar, para fazê-lo, a teoria que aprendi de você.
Freud: — Diga.
Eu: — Você tem dificuldade de pensar a castração e, por isso, executou-a.
Freud: — Como assim?
Eu: — Não é claro que pensar a castração como ablação do pênis é uma distorção de seu real significado?
Freud: — De imediato, não estou vendo maneira de escapar disso...
Eu: — Você não nos ensinou que quem não pensa, faz?
Freud: — E estou certo disso.
Eu: — Pois bem. Acho que a castração que você não conseguiu pensar — identificando-a enganosamente com a retirada do pênis e, não, das gônadas, sejam, os testículos e os ovários — essa castração não pensada você a executou em sua teoria, desvinculando a sexualidade de seus fins de reprodução, cometendo, em ambos os casos, infrações flagrantes, como vimos, da lógica e do bom-senso.
Freud: — Estou perplexo.
Eu: — Acha que vale a pena irmos adiante?
Freud: — Como assim?
Eu: — Você nos ensinou que, quando uma pessoa lógica e de bom-senso, comete uma infração evidente da lógica e do bom-senso, ela está sendo vítima da ação de idéias reprimidas. Não é assim?
Freud: — Não tenho qualquer dúvida quanto a isso.
Eu: — Você é uma pessoa lógica e de bom-senso, não?
Freud: — Considero-me assim.
Eu: — Também eu. Assim sendo, se uma pessoa lógica e de bom-senso, cometeu, em um ponto-chave de sua teoria, uma flagrante infração da lógica e do bom-senso, nesse ponto você deveria estar sob a ação de algumas dessas idéias. De acordo?
Freud: — Seria impossível não concordar. Mas qual seriam elas?
Eu: — Gostaria de agrupá-las sob o nome de Complexo de Caim.
Freud: — Você diz alguma coisa em relação aos meus irmãos?...
Eu: — Trata-se, naturalmente, de uma mera hipótese, que deveria ser testada a partir de suas associações espontâneas a ela.
Freud: — E qual seria essa hipótese?
Eu: — No meu entender, você usou materiais relativos a sua rivalidade com o seu pai — parte, em suas próprias palavras, de seu Complexo de Édipo — como memórias encobridoras de sua rivalidade com seus irmãos. Explico-me. Veja bem. Nos materiais do Complexo de Édipo, é seu pai o responsável pela ameaça de castração, que, em sua compreensão dessa última, visaria, não os testículos, mas o pênis. Na hipótese a que me estou referindo, é você que representa essa ameaça e, permita-me, ela se volta contra os ovários de uma mulher, sua mãe.
Freud: — Você está sugerindo que nossa culpa original está relacionada a um desejo de castração, não ao medo dela, e que esse desejo original está voltado para os ovários de nossa mãe, por rivalidade, não com nosso pai, mas com irmãos supostos ou reais?
Eu: — Não generalizemos. Eu estou sugerindo é que sua culpa original está relacionada a um desejo de castração voltado para os ovários de sua mãe, por rivalidade com seus irmãos, todos eles bastante reais. Uma generalização maior dependeria de outras análises, se bem que posso, desde já, admitir que tenho freqüentemente confirmado a presença do Complexo de Édipo como defesa erigida contra a conscientização do Complexo de Caim. Em todos esses casos, o menino projetou sobre a mãe seus próprios impulsos de castrá-la, passou a temer que ela fizesse isso com ele, deslocou essa figura materna ameaçadora para o pai e desviou seu medo de perder os testículos para o medo de perder o pênis.
Freud: — Bem, se for assim...
Eu: — Gostaria de completar algo antes de ouvi-lo. Acho que, em seu caso específico, esse impulso para castrar, insuficientemente analisado, possivelmente se fixou em torno do nascimento de sua irmã, Ana, nascida quando você tinha dois anos e meio de idade, mais do que em torno do nascimento de seu irmão Julius, que nasceu quando você tinha um ano e um mês, morrendo oito meses depois. Aliás, o nome Ana acompanhou-o pela vida afora. Sou inclinado mesmo a imaginar que foi você, e não Breuer, quem sugeriu para Bertha Pappenheim, o pseudônimo de Ana O..
Freud: — Eu...
Eu: — Deixe-me terminar. O sonho de Irma mostra claramente — embora você não tenha publicado isso em sua interpretação do sonho — que você, no momento em que o sonho ocorreu estava apreensivo com a possibilidade de haver engravidado sua mulher e albergava desejos de assassinar sua possível cria. Sua mulher estava, de fato, grávida à época do sonho e Ana foi o nome dado a filha que nasceu (será excessivo especular que o nome foi escolhido por você?). Filha que, certamente devido, pelo menos em parte, à relação que desenvolveu com o pai, não casou nem teve filhos (alguma duvida de que, embora ela não tivesse pênis, isso merece o nome de castração?) notabilizando-se, entretanto, exatamente por sua dedicação profissional ao tratamento de crianças?
Freud: — Tudo isso me deixa muito surpreso, mas confesso que acabo de me recordar de que...




[1]  Publicado originalmente em junho de 1985, nos Cadernos de Psicanálise,  revista oficial da Sociedade Psicanalítica Iracy Doyle.

TWO BASIC HUMAN MODES OF BEHAVIOUR

TWO BASICS HUMAN MODES OF BEHAVIOUR

Human behavior has two basic ideal modes of behavior:  the survival mode and the wellbeing mode, with infinite shades of gray in between.  The main characteristics

THE SURVIVAL MODE
THE WELLBEING MODE
Operating mode typical of societies or individuals subject to high levels of fear.
Operating mode typical of situations in which a society or individual are subject to low levels of fear.
It is a politically centralized modus operandi:  it favors concentration of power at the top of a social pyramid, blocks the free transmission of information and imposes upon its members a high degree of uniformity of conduct, abhorring individualism.;
It is a politically decentralized modus operandi: it distributes power throughout the whole social pyramid, favors the free transmission of information and allows its members a wide range of diversity of conduct, respecting individualism.
It is hostile and dominated by the male, whose inclination to fight and compete is highly appreciated, looking down on the weak and women, considered unfit for war .
It is amicable and impartially recognizing the specific values of men and women and it protects the weak
It values in principle the capacity to bear pain,scorning the quest for pleasure, but, on the other hand, simultaneously promoting compensatory escapism, be it behavioral, chemical or ideological.
In principle, it values pleasure, but it does not allow pleasure to be used as a means of escapism, being prepared to face functional pain whenever it necessary[1].[1].







[1]  The following passage from a speech by Pericles, the illustrious Athenian leader, may illuminate the point:  “while in education, where our rivals [the Spartans, of course] from their very cradles by a painful discipline seek after manliness, at Athens we live exactly as we please, and yet are just as ready to encounter every legitimate danger… And yet if with habits not of labour but of ease, and courage not of art but of nature, we are still willing to encounter danger, we have the double advantage of escaping the experience of hardships in anticipation and of facing them in the hour of need as fearlessly as those who are never free from them.”  InThucydides. The History of the Peloponnesian War, second volume, chapter VI, p 39-40. in: HUTCHINS, R. M. (Ed.).  The Great Books of the Western World. London: Encyclopaedia Britannica, Inc., 1952, vol. VI, p. 396-7.

LIABILITY


Sabedoria e saúde mental são palavras sinônimas, embora a primeira seja frequentadora do ambiente filosófico e a segunda, pelo do das ciências psicológicas.  Defino a ambas como “capacidade de usar o conhecimento a favor da vida”.  Essa capacidade implica termos a nossa disposição todos os repertórios possíveis de comportamento, essencialmente os derivados de nossas funções fisiológicas essenciais, as associadas à sexualidade (criar, cooperar, proteger, reparar), à fome (destruir, competir, explorar, dominar), ao sono (desligar-se, fantasiar) e à respiração (representar sem distorções as realidades interna e interna). 
Minha história pessoal infantil pôs-me envolto em uma série de mentiras, o que está à raiz de dois elementos fundamentais de meu desenvolvimento psicológico:  um, positivo, de me haver dedicado com sucesso à Psicanálise, tipo de psicoterapia essencialmente voltada para dissolver mentiras e, outro, negativo, uma “mentirofobia” que, durante muitos anos, prejudicou minha sabedoria e, consequentemente, minha saúde mental, empobrecendo meu repertório comportamental no sentido de tornar-me incapaz de mentir, mesmo em situações que seria mais adequado fazê-lo.  Por exemplo, cerca de 17 anos, fui preso – felizmente, solto horas depois – por haver falado a verdade, quando o mais funcional teria sido haver mentido.  Embora, atualmente, já tenha, em grande parte, superado essa fobia, ela ainda se manifesta sob formas sutis, não obstante relativamente inócuas.  Se não, vejamos. 
Hoje de madrugada, eu estava assistindo – sem som, para não acordar minha companheira adormecida - um filme com legendas em português e, como soe ocorrer, vou automaticamente brincando de vertê-las para o original, no caso em inglês, quando, subitamente, faltou-me, naquela língua, uma palavra que eu sabia conhecer, ou seja, em jargão técnico, eu estava sendo vítima de um lapso mnêmico, de uma falha em minha memória. 
Relaxei e fiz um pouco de “associação livre”, deixando pensamentos acorrerem a minha mente de maneira aparentemente aleatória, mas certamente determinada, e, logo, a palavra que me escapara apareceu:  “liability”, que o Webster’s New World Dictionary define, entre outras coisas, como “something that works to one’s disadvantage”, “algo que opera de forma desvantajosa para alguém”.
Recuperada a palavra, não foi difícil interpretar o lapso:  “liablility” pronuncia-se exatamente como “lie ability”, “habilidade de mentir”!  Lá estava, sorrateiramente e às escuras, operando “para minha desvantagem” minha alergia a mentir. 

Tenho 72 anos:  a busca da saúde psicológica e, portanto, da sabedoria é, de fato, um processo interminável!

quarta-feira


SANTA INGENUIDADE!

Alguns pensadores acusam a humanidade de estar viciada em Deus. Santa ingenuidade! Deuses são descartáveis: a humanidade está viciada EM ALTAR!
Havendo um, pouco importa quem nele trepa. A própria Revolução Francesa, disposta a se livrar de deus, não foi capaz de se desembaraçar do andor, e, para que ele não passeasse desguarnecido pelo Champs-Elysées, pespegou-lhe por cima uma imensa estátua... da Razão! Êta viciozinho brabo!
Bem poetava Pessoa:
"Nasce um deus. Outros morrem. A verdade
Nem veio nem se foi: o Erro mudou.
Temos agora uma nova Eternidade,
E era sempre melhor o que passou."
Fernando, todavia, se, por um lado, guarda razão em dizer que para a humanidade, como para qualquer torcida, a Verdade pouco importa, atropela-se, por outro, ao sugerir que a antiguidade de um deus é seu valor maior. Esqueceu-se que, dentre esta humanidade altar-addicted, se existe quem prefira a Tradição, há um número esmagador que prefere a Moda.
Com efeito, para qualquer torcida, importa que seu time ocupe o pódio, não a legitimidade do gol. A Verdade? Para o inferno com a ela! E, com ela ali, para os altaristas adictos à tradição, não cabe plantar em altar, andor ou pódio, seja Guevara, Chavez, Jung ou Lacan, se já se tem Marx e Freud. Nem, para os altaristas adictos à moda, permitir que Freud e Marx apoquentem nossos sonhos, se temos Guevara, Chavez (por que não Lula?), Jung e Lacan para aplicar-lhes mais cor.
Afinal, já basta a pachorrenta, monótona, iremediável e insubstituível presença do ALTAR.
Por que não trocar, ao menos vez ou outra, aquele que o ocupa?
Cristo que se cuide...

sábado

A PSICOPATIA


No que diz respeito à descrição clínica da psicopatia, não creio que haja contribuição capaz de superar o livro – genial até no título – “The Mask of Sanity” (“A Máscara da Sanidade”) – publicado pela primeira vez em 1941, de Hervey Cleckley.  O segundo marco na compreensão desse tipo de nosologia é a experiência levada a efeito, na última década de 60, por Robert Hare, psicólogo especializado em pesquisas sobre criminalidade, experiência que foi descrita em um trecho do artigo “How to spot a psychopath?” (“Como identificar um psicopata?”), publicado por Jon Ronson, em 21 de maio de 2011, na revista “Guardian Weekend”, o qual transcrevo, traduzido por mim, logo a seguir. 
Hare tornou-se internacionalmente famoso por ter desenvolvido um teste, usado universalmente por Departamentos de Justiça e Juntas de Liberdade Condicional, como valioso instrumento auxiliar no diagnóstico da psicopatia.  Os vinte traços de personalidade medidos pelo teste vão listados após as transcrições do artigo de Jon Ronson.  A influência de Hervey Cleckley no desenvolvimento dessa lista é mais do que óbvia.
[Minha tradução do texto de Jon Ronson é livre.  Não me parece que seu estilo, de tipo jornalístico, preste muito serviço a comunicações acadêmicas.  De qualquer forma, transcrevo o texto original logo após o meu]

"Em meados dos anos 60, [nota minha: Robert] Hare estava trabalhando como psicólogo numa penitenciária de Vancouver. Espalhou por ali a notícia de que estava à procura de psicopatas e não psicopatas [nota minha: segundo o diagnóstico existente em seus prontuários] que se voluntariassem para ser submetidos a alguns testes. Num deles, conectou os que se apresentaram a vários aparelhos capazes de medir pressão arterial, sudorese e ondas eletroencefálicas, e também a um gerador de eletricidade, explicando-lhes que iria contar regressivamente a partir de 10, sendo que, quando chegasse a 1, os voluntários receberiam um choque elétrico bastante doloroso.
A diferença nas respostas deixou Hare estupefato. Os não-psicopatas (que haviam, geralmente, cometido crimes passionais, ou crimes oriundos de terrível pobreza ou abuso) enrijeceram-se, apreensivos, como se o choque elétrico doloroso fosse a aplicação de um castigo merecido.  Estavam, notou Hare, assustados."
“E os psicopatas?" Perguntou Jon Ronson [o reporter autor do artigo]:
"Não verteram uma gota de suor", respondeu Hare . "Nada!".
O teste parecia indicar que a amígdala, a parte do cérebro que deveria ter antecipado a dor e enviado os sinais necessários de medo para o sistema nervoso central, não estava funcionando como deveria. Foi um enorme avanço para a Hare, o primeiro indício que obteve de que os cérebros dos psicopatas são diferentes dos cérebros normais.
Ainda mais estupefato ficou, quando repetiu o teste.  Dessa vez, os voluntários diagnosticados como psicopatas sabiam perfeitamente quanta dor iriam sentir e, mais uma vez, nada!  Hare concluiu algo que outros levariam anos para reconhecer:  psicopatas tendem inexoravelmente a reincidir no crime.  Diz ele:  “Os psicopatas não mantêm ativa a memória da dor do choque elétrico, que é “desativada” logo após haver ocorrido.  Portanto, é de todo inútil ameaçá-los com ser reconduzidos à prisão, caso descumpram os termos da condicional.  A ameaça NÃO TEM SENTIDO PARA ELES [a maiusculação é minha].
Ele fez uma outra experimento, o teste de ‘susto reflexo’, em que os psicopatas e não psicopatas foram inicialmente convidados a olhar para imagens grotescas, como fotografias de cena de crime de rostos desfigurados.  Em seguida, quando menos esperavam, Hare disparava um ruído incrivelmente alto em seus ouvidos.  Os não-psicopatas pulavam de espanto; nos psicopatas o abalo era significativamente menor.
Hare sabia que, se nos dão um susto, tendemos a pular muito mais alto se já estávamos previamente assustados. Mas, se estamos absortos por alguma coisa, um jogo de palavras cruzadas, por exemplo, e alguém nos assusta, o nosso pulo é significativamente menor.  A conclusão de Hare foi a de que, quando psicopatas veem imagens grotescas de rostos desfigurados, em vez de assustados, ficam fascinados por elas.
Entusiasmado por suas descobertas, Hare enviou-os a revista Science.
O editor devolveu o material enviado sem publicá-lo, com a seguinte observação apensa a ele: ‘Francamente, achamos muito estranhos alguns dos padrões de ondas cerebrais apresentados em seu artigo. Esses EEGs não podem ter provindo de pessoas reais’.”

Essa recusa da revista Science e o fato de que, pouco depois de haver iniciado suas pesquisas, o eletrochoque foi banido de instituições médico-psiquiátricas, impedindo Hare de replicá-las, certamente uma das razões pelas quais seus importantíssimos resultados são até hoje tão pouco conhecidos.  Dedicou, então, grande parte do restante de sua vida a transformar em teste a contribuição de Cleckley para a descrição da psicopatia, produzindo a hoje famosa “Psychopathy Checklist” (algo como:  “Lista de Checagem para o Diagnóstico de Psicopatia”), que reproduzo a seguir:

Fatores, Facetas e itens

Fator 1

Facet 1: interpessoal

Loquacidade / charme superficial
Senso grandioso de autoestima
mentira patológica
Astúcia / manipulação

Faceta 2: Afetiva

A falta de remorso ou culpa
Emocionalmente raso
Astúcia / falta de empatia
Incapacidade em aceitar a responsabilidade por suas próprias ações

Faceta 3: Estilo de vida

Necessidade de estimulação / tendência ao tédio
Estilo de vida parasitária
Falta de metas realistas a longo prazo
Impulsividade
Irresponsabilidade

Facet 4: Anti-Social

Controle comportamental deficiente
Problemas comportamentais precoces
Delinquência juvenil
Revogação de liberdade condicional
Versatilidade na prática do crime

Fator 2

Outros itens

Muitos relacionamentos conjugais de curto prazo
Comportamento sexual promíscuo

A reprodução do texto original de Jon Ronson vai a seguir:

["In the mid-60s, [Robert] Hare was working as a prison psychologist in Vancouver.  He put word around the prison that he was looking for psychopathic and non-psychopathic volunteers for tests.  He strapped them up to various EEG and sweat- and blood pressure-measuring machines, and also to an electricity generator, and explained to them that he was going to count backwards from 10 and when he reached one they'd receive a very painful electric shock.
The difference in the responses stunned Hare.  The non-psychopatic volunteers (theirs were crimes of passion, usually, or crimes born from terrible poverty or abuse) steeled themselves ruefully, as if a painful electric shock were just the penance they deserved.  They were, Hare noticed, scared.
‘And the psychopaths?’  I [Jon Ronson, the author of the article] asked.
‘They didn't break a sweat,’ said Hare. ‘Nothing.’  The test seemed to indicate that the amygdala, the part of the brain that should have anticipated the unpleasantness and sent the requisite signals of fear to the central nervous system, wasn't functioning as it should.  It was an enormous breakthrough for Hare, his first clue that the brains of psychopaths were different from regular brains."
He was even more astonished when he repeated the test.  This time, the psycophaths knew exactly how much pain they'd be in, and still:  nothing.  Hare learned something that others wouldn't for years:  psychopats were likely to reoffend.' They had no memory of the pain of the electric shock, even when the pain had occurred just moments before,' Hare said.  'So what's the point in threatening them with imprisonment if they break the terms of their parole?  The threat has no meaning for them.'
He did another experiment, the startle reflex test, in which the psychopaths and non-psychopaths were invited to look at grotesque images, such as crime-scene photographs of blown-apart faces, and when they last expected it Hare would let off an incredibly loud noise in their ear.  The non-psychopaths would leap with astonishment.  The psychopaths would remain comparatively serene. 
Hare knew that we tend to jump a lot higher when startled if we we’re on the edge of our seats anyway.  But if we’re engrossed by something, a crossword puzzle, say, and someone startles us, our leap is less pronounced.  From this Hare deduced that when psychopaths see grotesque images of blown-apart faces they aren’t horrified.  They are absorbed.
Thrilled by his findings, Hare sent them to Science magazine.
‘The editor returned them unpublished,’ he said.  ‘He wrote, ‘Frankly we found some of the brain wave patterns depicted in your paper very odd.  Those EEG couldn’t have come from real people.’”]